A vida e os apontamentos sobre ela
#3
Gosto de agendas.
Gosto de agendas porque me deixa alegre a ideia de que vou poder organizar a minha vida com cores garridas, como se pudesse arrumar tudo no sítio certo sem o frequente olvidar de aniversários, consultas ou a lista de três itens que saí para comprar mas só trouxe um porque entretanto me distraí no corredor das bolachas e dos chocolates.
Gosto de agendas porque gosto de papéis e cadernos e blocos de notas e canetas e agrafos e clips. Gosto de economato.
Gosto de terminar o ano com a agenda nova pronta, com as primeiras anotações e aquilo que tenho de fazer em janeiro, só que depois há dias que ficam em branco e isso aflige-me. Sinto que devia estar toda escrita, mas preencher o comum, o corriqueiro, as tarefas costumeiras do dia a dia parece-me uma coisa sem jeito nenhum. Não vou apontar que tenho de fazer o jantar ou de lavar a loiça ou de passar a roupa. Isso trata-se não em dias específicos, mas quando faz falta. Não tenho consultas ou reuniões na escola todas as semanas (graças aos santos, todos que eu não faço diferenças). Não tenho compromissos pessoais que mereçam registo todos os dias. E as obrigações profissionais ficam no Outlook do trabalho, para me entrarem olhos adentro com pop-ups. Então ponho-me a olhar para a agenda e impaciento-me com aquelas linhas todas por preencher, como se naquele dia a vida fosse vazia. A única coisa a registar é: mais-do-mesmo. Uma pessoa nunca sabe quando é que dá a bufa mestre e depois gasta assim dias, como se não servissem para nada, é mal empregue.
Então decidi começar a fazer um apontamento diário. A agenda vai com o livro para a mesa de cabeceira ao deitar. Uma caneta e anoto ali mais dúzia de palavras. Podem ser só adjetivos ou palavras soltas. Frases curtas. Tiradas e gracinhas do pequeno. Um retrato conciso do que me ficou cá na cabeça.
Assim a agenda fica a valer mais a pena, ajuda-me com as responsabilidades do futuro e ainda me guarda as notas do passado, para eu consultar no final do ano e relembrar o que raio fiz àqueles trezentos e tal dias.
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