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Exercício de escrita

Anotações de fim de dia

13.10.22

Nos últimos dias tenho pensado todos os dias: nos próximos tempos vou parar com as redes sociais. Vou pousar o telemóvel, vou pensar só nas coisas cá de casa, aproveitar cada suspiro e parar de encher feed com divagações que só me interessam a mim. Mas depois ocorre-me mais isto ou aquilo para escrever e cá estou de novo, a poluir espaço, a publicar anotações que provavelmente ficariam melhores guardadas nos confins da minha tola.
Mas há sempre uma ou duas pessoas que gosta de ler, que me diz que lhe soube bem ler o texto, e eu, numa certa vaidade imbecil, apareço para mais uma volta no carrossel.

Apercebi-me recentemente de que cada vez mais gosto de escrever porque cada vez menos gosto de conversar. Noto com frequência que apenas com a escrita consigo começar e concluir um raciocínio sem sentir que tenho de me apressar a chegar à reta final do tema antes que o interlocutor fique enfadado com a minha lengalenga. Sinto que o espectro de atenção do outro está cada vez mais curto e que a minha falta de voracidade a deglutir temas causa uma vontade imensa de fazer fast foward. Sei que se pudessem espetavam-me o indicador nas trombas e faziam scroll sem pensar duas vezes.
Parece-me que isso acontece porque a capacidade de ouvir está cada vez mais diminuta. As pessoas querem desbravar temas com a rapidez de um funcionário do Lidl a passar artigos na caixa. Fazem-no porque há demasiadas coisas para gerir, fazem-no porque também é assim com elas quando precisam de falar, fazem-no porque por melhor que seja a vontade são também pessoas que precisam de ser ouvidas e, quando se disponibilizam para escutar o outro, dão consigo em menos de nada a inverter os papéis e a tornar a conversa sobre si. Sobre o que gostariam de falar ou de ter falado com alguém.
Tem-me acontecido de quando em vez. A gravidez e o nascimento da bebé é o ponto de partida para me perguntarem por mim e ao fim de pouco tempo sou eu que estou a ouvir.
Não me irrito, mas farto-me depressa. Acima de tudo porque me deixa ansiosa a incapacidade de terminar um tema de fio a pavio.
Não sei se isto acontece porque estamos todos mais egoístas, porque estamos menos interessados nos outros, porque a vida nos engole e também precisamos de um par de ouvidos que nunca aparecem a menos de paguemos bem à hora. Pelo menos agora a terapia começa a ser uma necessidade normal, ainda que haja caminho para fazer. Não sei se é assim porque nos sentimos cada vez mais sozinhos, sem sentido de camaradagem, empatia ou comunidade.
Sei, apenas e só, que nesta vida de velocidade F1 tenho a sorte de ter a meu lado alguém sempre disponível para conversar e para ouvir as minhas divagações. Tenho a sorte de ter a escrita, que me permite fazer este exercício para arrumar ideias e compôr os ficheiros do meu arquivo.

 

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