É preciso haver vida para além da guerra.
Parece-me imperativo que assim seja.
Os últimos dias têm sido avassaladores, é inquestionável.
Gente inocente a perder tudo às mãos de um fanático.
Coloca a vida em perspetiva. Faz pensar: e se fosse eu. Meu Deus, se fosse o meu filho agarrado à minha mão. O desespero por um comboio, por atravessar uma fronteira. Se fosse o meu irmão, marido, sobrinho, com uma arma na mão para combater.
Mas a vida tem de seguir. Todos os outros temas que revestem os nossos dias continuam aqui, não ficaram congelados no tempo. Por mais fúteis que possam parecer por comparação. Não é preciso respirar guerra a tempo inteiro para se ser solidário, para se estar interessado, para se querer fazer parte da solução.
E depois, para além da nossa vida comezinha, que nos parece de repente quase privilegiada, é preciso desanuviar.
É preciso fazer rir. É preciso rir. Encontrar do que rir no meio da desgraça é muitas vezes a fonte de alento para continuar. Porque quando ainda nos rimos da vida e até do mal que ela nos faz, nesse instante estamos a levantar os punhos, a dizer que estamos cá para mais uma ronda.
Rir é muito mais do que rir. É viver, por breves instantes, para além do que nos atormenta, do que nos assusta, das sombras e dos monstros.
Rir acalenta esperança.
Já chorei muito com o que está a acontecer. Já me senti para lá de impotente. Mas já me ri tanto com pequenas coisas e com atos de coragem verdadeiramente gangsters. Já me ri tanto com os dois georgianos que se recusaram a abastecer o navio russo e os mandaram ir a remos. Aquilo é malta de Corroios em esteroides. O que já me ri com o mapa português que reclama a Rússia como nossa de acordo com o tratado de Tordesilhas. O que já me ri com o peso dos tomates dos ucranianos. O que já me ri com a @misscaco e a potencial parceria entre o Zelensky e a Prozis. O que já me ri com o ucraniano que levava uma mina de um lado para o outro enquanto tinha o seu Marlboro no canto da boca.
Gente como o Putin não merece o poder de nos deixar atolados em medo. Reféns do que pode ou não fazer-nos rir. Quando nos rimos destas pequenas coisas, ele ganha um pouco menos.
Ou pelo menos eu acho.
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