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Exercício de escrita

O dinheiro não compra felicidade, dizem.

06.08.21

Mas compra uma casa com jardim e piscina. Paga o ordenado a uma empregada para a manter limpa e a um jardineiro para que o jardim não se transforme num pardieiro. Compra viagens para destinos paradisíacos. Paga a amas para que cuidem das crianças enquanto os pais descansam a cabeça. Compra as roupas que se quiser. Paga despesas médicas, hospitais privados, tratamentos alternativos e complementares. Dá a possibilidade de, em muitas das coisas da vida, dizer “eu não estou para isto”, virar costas e começar de novo.

O dinheiro não compra felicidade, mas alivia o fardo.

O dinheiro compra uma possível solução ao pai que precisa de um medicamento caro para o filho com uma doença rara, dá-lhe esperança e tempo para estar com o filho nem que seja mais um dia. Ameniza a amargura da mãe que hoje tem de pedir a uma associação que lhe deixe um saco de comida para que os filhos não passem fome. Atenua o mal-estar do velhote que com a sua reforma miserável deixa mais uma lista de medicamentos na conta da farmácia, porque se os comprasse todos não tinha que chegasse para a água, luz e gás.

A felicidade não se compra em frascos, nem se escolhe como alguns apregoam. Porque a felicidade não se desembrulha de uma caixa que escolhemos tirar da prateleira em detrimento da caixa acinzentada da tristeza.

O dinheiro não compra felicidade, mas compra opções. Compra tempo. Compra a possibilidade de escolher ficar ou sair de um emprego que transtorna. Solta amarras. Compra tempo e qualidade.

Compra liberdade, de todas as forma e feitios. Basta que olhemos à nossa volta. Paga aos advogados competentes, paga fianças, adia processos.

Compra independência e autonomia.

O dinheiro, se fosse assim tão despiciendo, não andava o mundo atrás dele. Uns a querer comprar mais barato para que lhes sobre no bolso, outros a querer pagar mais caro para ganhar um estatuto social superior. Os empregos de horas infinitas para um cargo cada vez mais alto, de mais poder e de mais dinheiro. Se o dinheiro não comprasse felicidade não se tentava vender a dita a cada esquina. A felicidade da aceitação num livro que está aqui, é só comprar. A felicidade em três, cinco e sete passos, é só comprar e aplicar. A felicidade num retiro, é só pagar. A felicidade e bem-estar depois da terapia, é só ter dinheiro para as sessões. A felicidade e leveza nos sumos milagrosos que desintoxicam, é só comprar um pack de três dias pelo dinheiro das mercearias de uma semana para uma família de quatro. E podia continuar até ao infinito.

O dinheiro não compra felicidade, dizem. Mas compra sonhos. Constrói uma casa sem vizinhos em cima e em baixo, onde os miúdos podem brincar com os amigos no escorrega que está nas traseiras. Compra tranquilidade e abafa as preocupações que amiúdam a vida de moedas contadas no bolso até ao fim do mês. 

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