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Exercício de escrita

Quatro

11.11.22

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Gosto de castanhas de qualquer modo. Cruas. Assadas. Cozidas com erva doce. Piladas, daquelas que partem os dentes. Gosto do cheiro das castanhas assadas porque me fazem lembrar momentos bons da minha infância. Os cones feitos de folhas das páginas amarelas com meia dúzia de castanhas e a minha mãe danada com o vendedor quando metade tinha bicho; a minha mãe satisfeita com a honestidade do vendedor quando as seis castanhas estavam boas.

Ontem fui comprar castanhas. Caríssimas. Na banca, metade delas estragadas. Eu que tempos a escolher castanha a castanha. A apalpá-las como os velhos apalpam as mangas, até as deixar em estado pré-batido. Uma mão cheia para mandar para a escola. Dia de São Martinho. Iam assar as castanhas que os meninos levassem e eles, em vez de contas e cópias, iam saltar à corda e fazer gincanas. Mas cá em casa apanhou-se "fruta da época" e entre lenços e xaropes, houve quem ficasse em casa, triste, a dizer mal da vida, porque até tinha as castanhas para assar, aquelas que não ia comer, ia distribuir entre os amigos. Todos os anos prova, esquecido ou na esperança de que o palato mude, e depois diz: mãe, não gosto assim tanto.
Então prometi-lhe que faríamos biscoitos da avó (sou a única que come castanhas cá em casa), daqueles que borram as mãos de tal forma que ao terceiro ele me diz: mãe, tu tens mais jeito. Uma forma delicada de me dizer: faz lá mas é tu isso.
Depois decidi que me safava melhor com umas bolachas mais simples e fiz umas mesmo saborosas do @opecadomoraemcasaoficial (metade do tabuleiro já foi).

De volta às castanhas. Segui as dicas da Filipa Gomes à risca e ficaram uma delícia. Papei-as todas. Não sabem ao mesmo que as da minha mãe, não sabem às que o vendedor assa e embrulha nas folhas de jornal (não podem saber ao mesmo porque o fumo não se entranha na roupa enquanto espero e as mãos não ficam negras da tinta do jornal e das castanhas sujas da cinza do carvão), mas sabem a esta minha família e às coisas que fazemos juntos.