Vinte e quatro
O tempo que passamos só as duas é assim: uma mão que procura a outra. A dela que quer saber-me ali, ainda dela, as duas uma só. A minha a aproveitar que ainda é tempo de ela chamar por mim porque lhe faço falta, porque o meu colo é o melhor dos repousos.
Fazemos tarefas juntas. Eu a execurar, ela (imagino) a opinar sobre a qualidade do que está a ser feito. Um dialeto de gritinhos reduzidos a duas vogais e três consoantes. Sorrisos largos que mostram uma gengiva careca e beicinho quando a espera por colo já vai longa. Dois desgastantes minutos. Nem nas finanças se espera assim.
Colo. Conversa inventada. Sonos curtos interrompidos ao mínimo barulho para que não lhe escape pitada. Horas a dormir encostada ao meu peito e eu, deleitada, apesar do ardor nas costas, aproveito para ler ou para puxar do telemóvel e, com pouco jeito, registar as minhas notas, como estas. Umas que guardo e outras que deixo aqui.
Parece que nasceu ontem e num piscar de olhas vai-se o tempo da licença e passamos a estar juntas só uma parte do dia, como se ela já fosse uma quase adulta capaz de ir à vida dela, como se quatro meses chegassem para estar agarrado a quem esteve nove meses dentro de mim, cada dedinho, cada pestana, feitos neste corpo.
Por mais cliché que possa ser, a verdade é que estamos todos rendidos à maior das evidências: o tempo passa depressa de mais. Especialmente quando estamos bem. Parece que os ponteiros vão a correr em vez de andar.
Já se ri, já palra, vai-se aguentando numa espécie de sentada. Não tarda nada já me diz "ê conségu", tal como o irmão quando aprendeu que eu não me havia de meter nos assuntos dele.